Estive no Rio de Janeiro no último final de semana de novembro, quando aproveitei para conferir alguns espetáculos. Entre eles, a nova montagem de Ópera do Malandro, de Chico Buarque, que ficou em cartaz no Theatro NET Rio de 08 de agosto a 30 de novembro de 2014. Fui na sessão da sexta-feira, 28 de novembro, 21 horas. Tinha comprado o ingresso pela internet, pois tinha lido que estava muito concorrido. E realmente estava, pois o teatro ficou totalmente lotado. Fui com Karina, Alberto e Cristiano. Não conhecia o teatro, embora antigo. Ficamos em local que nos permitiu ótima visualização do palco.
Ópera do Malandro sempre esteve no meu imaginário, em minhas memórias afetivas. Quando da primeira montagem, no final dos anos setenta, eu tinha treze anos e a censura da época não permitia a entrada para menores de dezoito anos., portanto, não consegui ver. Lembro-me bem quando ouvi o LP duplo com as músicas da montagem, lançado na mesma época do musical. Fui passar uns dias na casa de meu padrinho. Ele tinha acabado de comprar o vinil. Eu não me cansava de colocar aquele vinil na vitrola. Logo decorei todas as músicas. Alguns anos depois, meu tio me deu justamente aquele vinil. Foi uma alegria infinita. Hoje não tenho mais nenhum toca discos, mas o LP ainda existe. Está na casa de Ricardo, intacto, perfeito.
Voltemos ao musical.
A primeira montagem ficou marcada pela qualidade do elenco e pela músicas, que criaram vida própria, descolada da peça, com interpretações memoráveis de Gal Costa, Elba Ramalho, Moreira da Silva, entre outros. Ruy Guerra transpôs a história de Chico, que é baseada nas óperas A Ópera do Mendigo e A Ópera dos Três Vinténs, para o cinema em meados dos anos oitenta. É esta referência visual que tenho, além de montagens amadoras feitas por escolas de artes cênicas. Houve uma outra montagem bem cotada no início deste século, que tinha Lucinha Lins como uma das intérpretes, mas não consegui ver.
A ler que esta nova montagem era dirigida por João Falcão, fiquei curioso, pois ele é um diretor que foge do óbvio. Ao ler sobre o elenco, vi que realmente ele se distanciou das montagens anteriores ao escalar apenas atores para todos os papéis masculinos e femininos. Apenas uma atriz integra o elenco, interpretando João Alegre, uma espécie de narrador e costurador da história, com figurino que nos remete aos musicais da Broadway. E outra questão que me deixou curioso foi a escalação do sambista Moyseis Marques para viver o protagonista Max Overseas, já que ele não é ator.
O musical tem muitos personagens. Com apenas quatorze atores em cena, Falcão colocou alguns deles vivendo mais de um papel. Assim, os capangas de Max Overseas são interpretados pelos mesmos atores que fazem as moças do bordel de Duran. Pode haver uma dificuldade de identificação por parte do público, mas os atores conseguiram encontrar um ponto definido para cada papel, com gestual, timbre de voz (especialmente quando cantam), e postura no palco ora masculino, ora feminino.
Quanto à história, Falcão não se utilizou de nenhuma licença poética. Ambientou-a na mesma Lapa do original, assim como na mesma época, anos 40. A história é contada em dois atos, sendo o primeiro mais longo e com um desenvolvimento melhor da história. A segunda parte me pareceu corrida, com um final abrupto, como se tudo tivesse que ser resolvido de uma vez só.
O elenco é o ponto alto do espetáculo. A qualidade técnica e vocal de todos é muito boa, diferente do que acontece em alguns musicais em cartaz nos últimos anos, como Cazuza, onde o elenco de apoio é muito inferior vocalmente do que o protagonista. Destaco o sambista Moyseis Marques, habitué nos bares da Lapa, que além de ótima interpretação musical, se revelou um bom ator. O ator que faz Duran, Ricca Barros, também é destaque, assim como Adrén Alves, que interpreta Vitória, esposa de Duran e mãe de Teresinha de Jesus (Fábio Enriquez). O público escolhe rapidamente seu favorito. Na primeira aparição de Eduardo Landim como Geni, a empatia com a plateia é tanta que quando ele interpreta Geni e O Zepelim (no vinil cantada por Chico Buarque), a ovação é inevitável, assim como na apresentação dos atores ao final do espetáculo.
Após três horas de espetáculo, saí satisfeito, mesmo com a ressalva que o final foi apressado.
artes cênicas
Léo, ótima resenha crítica. Escrevo, agora, um artigo sobre a "Ópera o malandro", centrando a análise naqueles que admiram seguem e se apaixonam pelo malandro, que "anda assim de fieis". Vi alguns trechos da montagem no youtube (vídeo de divulgação) e entrevistas com os atores e João Falcão e sua resenha traz outras tantas e boas ponderações críticas. Como sempre, valeu!
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