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quinta-feira, 21 de agosto de 2014

CONSELHO DE CLASSE - CENA CONTEMPORÂNEA 2014

Começou a 15ª edição do Cena Contemporânea. Comprei ingressos para vários espetáculos. Iniciei a maratona pela peça de estreia da edição 2014 deste ótimo festival de teatro de Brasília.
Terça-feira, 20 de agosto. A peça estava marcada para ter início às 21 horas no Teatro Funarte Plínio Marcos. O estacionamento ao lado do Complexo da Funarte é amplo, sempre com tranquilidade para encontrar vagas. Mesmo assim, fui cedo para lá. Esta foi minha sorte, pois não contava com um estacionamento repleto de carros, a esmagadora maioria de torcedores do Vasco que foram ver um jogo válido pelo campeonato da segunda divisão de futebol que aconteceria no Estádio Nacional Mané Garrincha. Consegui uma vaga mais longe do local onde costumo parar.
Em frente ao teatro, cujas grades estavam fechadas impedindo o acesso ao pequeno hall do local, duas filas se formavam. A da esquerda era de quem tinha ingresso, onde logo me posicionei, enquanto a da direita era daqueles que ainda tentariam comprar entrada para a sessão da noite. Vários torcedores vascaínos passavam por lá e estranhavam aquele público em duas filas. Presenciei uma turma deles pensando que ali era a entrada do estádio.
Na medida em que o tempo passava, as filas cresciam, tanto em linha reta para trás quanto para os lados. Era tanta gente que conhecia tanta gente que alguns bolinhos de pessoas se formavam em determinados pontos da fila. Não sei o motivo, mas só abriram as grades e liberaram a nossa entrada quando os ponteiros do relógio já anunciavam ter passado do horário previsto para o início da peça. A saudação gravada do festival foi ao ar ainda com a maioria das pessoas do lado de fora. Houve uma considerável demora para acomodar todo mundo, inclusive aqueles que estavam sem ingresso. Tive a impressão que todos que estavam sem entrada tiverem êxito e entraram. O teatro ficou completamente lotado para ver Conselho de Classe, uma das peças que celebrou os vinte e cinco anos de carreira da Cia dos Atores, do Rio de Janeiro. A lotação completa era bom sinal, pois mostrava que o público estava ávido por teatro, ávido por celebrar o festival, mas ao mesmo tempo, a mesma lotação me indicava que o calor seria forte ali dentro. E foi.
O espetáculo começou com cerca de quarenta minutos de atraso.
O cenário mostrava uma escola com problemas visíveis de manutenção, ficando iluminado desde a entrada do público.
O texto de Jô Bilac é contundente (adjetivo que "roubei" de Fernando Guimarães), escancarando as mazelas da educação no Brasil, seja na questão do aspecto físico da escola, onde faltava até mesmo água potável, seja pela remuneração ridícula que um professor da rede pública recebe do poder público, no caso, do Governo Estadual do Rio de Janeiro. E ainda há a discussão sobre o papel da escola junto à comunidade, a falta de atualidade na gestão escolar e o conflito de ideologias entre os professores que formam o corpo docente daquela unidade.
São quatro atores que interpretam as professoras durante um conselho de classe perto do final do ano. São quatro homens que interpretam quatro mulheres, mas as diretoras Bel Garcia e Susana Ribeiro preferiram deixá-los com figurino masculino, sem alterações no modo de falar e com pouco gestual feminino. Soou estranho em um primeiro momento, mas esta forma deixou as questões meramente masculinas/femininas devidamente distanciadas das discussões centrais.
Ainda há mais um ator em cena interpretando o diretor substituto que chega como enviado da Secretaria Estadual de Educação para dirigir o conselho de classe e colocar ordem na casa, após um incidente que ocorrera com a diretora titular.
Em cena, o calor era de matar, e, na plateia, o desconforto das cadeiras e a falta de ar condicionado no teatro foram perfeitos, mesmo que de forma não proposital, para a sinergia com o cenário e para uma melhor aproximação com o que se passava na quadra da escola.
Os atores estão muito bem, inclusive o estrangeiro Thierry Trémouroux, mesmo com certa dificuldade em entender algumas frases que ele falava, especialmente quando não estava virado para a plateia. Quem estava nas últimas fileiras da sala tiveram, nitidamente, tal dificuldade. Um cara que estava sentado ao meu lado me perguntou por mais de uma vez o que o ator tinha acado de falar.
Embora os desempenhos individuais sejam dignos de notas elogiosas, o que prevalece durante toda a encenação é a força de grupo. O coletivo é muito forte neste espetáculo. Um ponto alto são os embates vivenciados pelas personagens, o que possibilita interessantes duelos entre os atores.
Pelo que escrevi até aqui, pode parecer, para quem está lendo, que eu gostei da peça, mas há uma questão que me incomodou muito e jogou por terra, na minha visão, a discussão profunda que há no texto. Foi a opção por dar um tom de comédia no desenvolvimento da história. Claro que ri de várias situações, mas creio que esta escolha atrapalhou bastante a reflexão sobre o texto. As professoras ficaram no limiar do estereótipo do funcionário público que não tem compromisso com nada, ou ao contrário, daquele que é engajado politicamente e quer mudar o mundo a partir de ações na comunidade. Não é à toa que quem faz este papel é o único que não tem um tom burlesco na interpretação. No caso a Professora Mabel, vivida por Trémouroux.
Muitos sabem que professores, especialmente os da rede pública de ensino, fazem bicos, são sacoleiros, como a Professora Célia da peça, mas a forma como esta situação é mostrada me soou um tanto quanto excessiva. Ouvi uma pessoa comentando na saída que a mãe dela era professora e que, com certeza, não gostaria de ser retratada como aquela que passa hidratante nas pernas ou lixa a sola dos pés durante uma reunião do conselho de classes da escola onde trabalha. Realmente esta provocou muitas risadas na plateia, mas era totalmente dispensável no contexto.
Ao final da apresentação, as palmas calorosas e os gritos de vivas mostraram-me que a maioria gostou do que presenciou.
Eu saí com a sensação que poderia ter sido melhor, que a direção errou a mão.

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