Segundo dia do Festival de Teatro Internacional de Brasília Cena Contemporânea 2014. O espetáculo para o qual tinha ingresso era Pichet Klunchun and Myself, em cartaz no Teatro I do CCBB. Uma amiga tentou comprar entrada para a mesma sessão um dia antes, mas não conseguiu. Ingressos esgotados para as duas únicas apresentações em Brasília. A mesma informação estava na edição de terça-feira, 20/08/2014, do Correio Braziliense.
Como fui direto do trabalho, cheguei às 19:45 horas no CCBB, onde encontrei Hélida G., que tinha duas entradas para o espetáculo. Ela precisava de mais um. Antes de lancharmos no café ao lado do teatro, fomos à bilheteria para ver se alguém tinha desistido. Para nossa surpresa, a produção do Cena tinha acabado de devolver ingressos destinados aos patrocinadores. Compramos o ingresso que ela tanto queria. Era hora de lanchar.
Eu tinha poucas informações sobre o que veríamos. Sabia que era um espetáculo de dança, mas ao ler a sinopse no livreto do festival, percebi que não seria bem um balé com coreografia. Seria uma espécie de bate papo. Compramos nosso lanche, sentamos em uma das mesas do lado de fora, aguardando as outras duas pessoas que nos acompanhariam, Fabíola e Lana.
Ao lado da entrada do Teatro I montaram uma mesa para entregar ao público um aparelho igual aos usados em conferências com tradução simultânea. Para pegá-lo, bastava entregar um documento que seria devolvido ao final da sessão.
Antes de entrar, perguntei a uma pessoa da produção do Cena o motivo do aparelho. O espetáculo seria todo falado em inglês. Resolvi entrar apenas com meus ouvidos. E foi muito tranquilo.
Houve um pequeno atraso, pouco mais do que dez minutos, para o início. Assim que soou o terceiro sinal, houve uma movimentação para troca de lugares, pois muitos assentos ficaram vazios. Creio que os convites distribuídos pelos patrocinadores não foram utilizados pelos contemplados.
No palco estavam duas cadeiras posicionadas uma em frente à outra em uma distância de uns três metros entre elas. Na cadeira da esquerda se sentou Pichet Klunchun, um bailarino tailandês, que estava descalço. Na cadeira da direita, o bailarino, coreógrafo e diretor francês Jérôme Bel, que tinha um notebook nas mãos. Assim que os dois se acomodaram em suas respectivas cadeiras, teve início um diálogo muito interessante, que foi crescendo ao longo dos 105 minutos de duração do espetáculo. Era uma espécie de entrevista na qual Jérôme conduzia as perguntas. Klunchun é um especialista em Khon, dança tradicional tailandesa. Jérôme perguntou o que é a dança, como ela começou e suas principais características. Klunchun foi mostrando, pacientemente, os passos mais marcantes do Khon, assim como seus principais personagens: homem, mulher, demônio e macaco. E ver o bailarino tailandês executar a coreografia passo a passo, gesto a gesto, com a devida explicação de cada um deles, foi uma das coisas que mais gostei no espetáculo. Quando o entrevistado vira o entrevistador, as performances de Jérôme Bel no palco são ótimas, demonstrando os motivos pelos quais ele está longe de ser uma unanimidade no mundo da dança. Suas peças não tem coreografias mirabolantes. Ele coloca no palco ações que qualquer um que o assiste poderia executar.
E neste interessante embate entre a tradição e o contemporâneo, entre o Ocidente e o Oriente, ganhou quem estava assistindo. O bate papo foi ótimo para provocar reflexões sobre a importância de se manter a tradição, mas também de inovar, de trazer algo diferente para chacoalhar a mesmice que impera no mundo.
Entre os muitos bons momentos, destaco dois:
1) Klunchun interpretando uma mulher quando ela recebe a notícia de que seu marido morrera em uma batalha. Os movimentos mínimos de seu corpo transmitiram toda a tristeza, incluindo um delicado choro.
2) Jérôme interpretando e dublando a canção Killing me softly with his song. Foi divertido, mas como uma possibilidade de se pensar a morte.
E a encenação da morte foi um dos temas debatidos entre eles, assim como a nudez em cena, algo normal para o francês, mas cheio de pudores para o tailandês.
Espetáculo primoroso.
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