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domingo, 29 de julho de 2012

LUÍS ANTÔNIO-GABRIELA - CENA CONTEMPORÂNEA

No sábado fui ver mais uma peça do festival Cena Contemporânea. Desta vez na Sala Plínio Marcos do Complexo Cultural da Funarte. Como não havia assento marcado, cheguei meia hora antes para garantir um bom lugar. A fila já estava grande. A porta do teatro foi aberta exatamente na hora que estava previsto para ter início o espetáculo, mas o atraso não foi grande, pois o público rapidamente se acomodou e os seis atores da Cia Mungunzá de Teatro, radicada em São Paulo, já estavam em cena, juntamente com dois músicos. Eles faziam alguns exercícios de aquecimento de voz e corpo. Quinze minutos e a peça Luís Antônio-Gabriela teve início. Argumento, dramaturgia e direção cabem a Nelson Barkerville. O elenco é formado por Marcos Felipe, Lucas Beda, Sandra Modesto, Verônica Gentilin, Virgínia Iglesias e Day Porto. Para contar uma parte de sua própria vida, o diretor Baskerville utiliza uma mistura de teatro,  dança, música e projeções de vídeo. É, na verdade, uma espécie de documentário encenado, onde nada tem muita cor, predominando os tons cor de pele, preto e palha. O diretor narra a história de seu irmão mais velho, Luís Antônio, e a relação que ambos tiveram até se separarem para sempre. A história é narrada pelos seis atores, que se apresentam com seus verdadeiros nomes informando à plateia os personagens que irão interpretar. Duas personagens se sucedem na narrativa, desde o nascimento, da infância de Luís Antônio e de Nelsinho (o diretor). A história é triste, mas esta tristeza não é usada para deixar o público sensível e pendente para este ou aquele personagem. O público fica um tanto quanto hipnotizado com a história de vida de Luís Antônio, um garoto que tinha trejeitos femininos desde pequeno, que violentou Nelsinho, seu irmão mais novo, foi vítima de violência familiar, em época que se acreditava curar a homossexualidade com porrada, foi expulso de casa, viveu um tempo com os avós, para, enfim, ganhar as ruas, convivendo com drogas e prostituição em Santos, até se mudar para Bilbao, Espanha, no início da década de 80, onde se transformou na travesti Gabriela, chegando a fazer sucesso com dublagens nas boates da cidade. Fica muito doente, vítima da aids, e recebe, após um longo período, a visita de sua irmã, morrendo sozinho no hospital. Os atores dançam, cantam, manejam a iluminação, as câmeras de vídeo, e montam e desmontam o cenário ao longo dos cerca de noventa minutos de duração da peça. A música é executada ao vivo, tanto por dois músicos quanto pelos atores, que também tocam alguns instrumentos em cena. Há muitas cenas interessantes, como a briga familiar em um domingo dentro de uma Rural (nem me lembrava deste carro mais), da dublagem de Gabriela com uma roupa feita com plástico, ou da visita de Gabriela e sua irmã, Maria Cristina, ele muito doente, em uma exposição no Museo Guggenheim, quando várias telas pintadas pelo artista plástico Thiago Hattner são abertas pelos atores (elas estavam o tempo inteiro enroladas e penduradas no teto. Para abrí-las, eles puxaram uma corda), todas retratando travestis. Uma das telas é toda preta, em frente a qual o ator Marcos Felipe, intérprete de Luís Antônio-Gabriela, se posiciona em pose que remete a mais um quadro da mostra no museu. Sua expressão é de alegria e de tristeza simultaneamente, como se fosse um adeus à vida, mas com uma pose em "fotografia" eternizada em uma pintura. Todo o elenco é muito bom, com performances precisas, mas Marcos Felipe é o grande nome da peça. Sua interpretação não dá um ar jocoso ao homossexual, mas transmite toda a sua afetação durante o espetáculo. Ao final, com as luzes apagadas, apenas um display fica ligado no qual o diretor Baskerville pede desculpas publicamente ao irmão por não tê-lo compreendido na época e por não tê-lo encontrado mais depois que ele se mudou do Brasil. Aplausos longos e calorosos para um ótimo espetáculo. Foi a última peça que vi nesta edição do festival e gostei muito. Mesmo tendo achado Apple Love a pior apresentação que já vi em todas as edições do festival, o Cena Contemporânea 2012 teve uma das melhores programações de sua existência, com peças de altíssimo nível como Estamira, Beira do Mundo; (Des)conhecidos e Luís Antônio-Gabriela. Infelizmente não vi Mi Vida Después, da argentina Lola Arias, peça bastante comentada nas rodinhas nos teatros e no ponto de encontro do festival na praça do Museu Nacional da República. Não se consegue ver tudo. Que venha 2013!

teatro

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