Pesquisar este blog

sábado, 26 de março de 2022

PROFISSÃO: REPÓRTER (PROFESSIONE: REPORTER)

Profissão: Repórter (Professione: Reporter), 1975, 126 minutos.

Direção de Michelangelo Antonioni, com Jack Nicholson (David Locke) e Maria Schneider (moça).

Vi este filme no início dos anos 1980, em uma sessão na Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, onde eu era estudante. Na época, achei cansativo e arrastado. Quatro décadas depois, sem me lembrar absolutamente nada do filme, o revi para o ciclo sobre cinema e filosofia do Clube da Análise Fílmica, coordenado pelo Prof. Alysson Gutemberg. Minha visão foi totalmente diferente agora.

Com muitas cenas longas sem nenhum diálogo, o que conversa com o espectador são as imagens e a performance dos atores. Um primor, que mostra solidão, fuga para liberdade, frustração, momentos de euforia e de depressão.

Antonioni é um gênio por trás das câmaras, fazendo com que cada milímetro de imagem na tela faça sentido para a história de David Locke, que foi designado para cobrir uma guerrilha na aridez desértica de um país africano, sofre alguns reveses com seus guias no deserto, se frustrando não só na sua missão, mas de sua própria vida.

Locke conhece Robertson, hóspede no mesmo hotel em que estava, com quem faz uma longa entrevista, conhecendo um pouco da vida do cara. Robertson morre repentinamente. Ele não tinha parentes, nem amigos. Locke, frustrado com sua vida, resolve trocar de identidade com o morto, pensando que assim se livraria dessa frustração, de sua vida de casado, de sua profissão, de seu passado.

Começa a sua fuga para a liberdade, sem saber muito para onde ir. Nesta caminhada, descobre que Robertson, sua nova identidade, é um traficante de armas, conhece uma moça em Barcelona, cujo nome nunca é dito no filme, com quem começa a ter uma relação. Ela o acompanha em sua viagem pela Europa. Ambos estão fugindo de algo, em busca da felicidade e da liberdade. Os compradores de armas começam a perseguir Locke querendo que o negócio feito com Robertson seja concretizado. Mas nem tudo são flores nesta caminhada.

A sequência inicial é ótima, com raros diálogos, mostrando Locke em sua jornada pelo deserto imerso em sua solidão. Nesta cena, Antonioni usa planos bem abertos, contrapondo a pequenez de Locke com a imensidão de areia. Aqui fica clara a solidão na qual vive o protagonista da história, mas também sua arrogância, se achando superior perante os africanos.

A sequência final é sensacional, sem nenhum diálogo, em cena longa, quando acompanhamos a câmera, posicionada dentro do quarto de hotel onde Locke está, mostrando a parte exterior, tendo a grade da janela como enquadramento. A câmera vai se movimentando lentamente, até "passar" pela grade, quando temos um plano aberto, novamente com uma paisagem árida, com poucas pessoas, desta vez em uma cidade do interior da Espanha. Neste movimento da câmera, aparecem, do lado de fora do hotel, todos os personagens que tinham relação com Locke durante sua jornada: a moça, a polícia, a sua mulher, seu colega de redação no jornal, os compradores de armas. Só um mestre poderia entregar tanto em uma cena lenta, sem diálogos, mas com muito conteúdo. Para mim, fica clara a mensagem de que Locke, mesmo trocando de identidade, não conseguiu se livrar de seus conflitos internos, de sua persona, e de seu passado, terminando imerso em uma fria solidão em um quarto de hotel.

Também há que se destacar o uso das cores. Tons mais pastéis nas etapas de solidão de Locke e mais coloridos em seus momentos com a moça em sua jornada pela Europa.

Disponível no Belas Artes À La Carte.

Nenhum comentário:

Postar um comentário