Acordei e logo abri as cortinas. Montanhas nevadas compunham a paisagem. Estava diante do Fiorde Almirantazgo. Já navegávamos na Baía Ainsworth, onde o navio ancorou. Às 8 horas anunciaram que o café da manhã já estava sendo servido no Comedor Patagônia. Serviço de buffet, com opções de pães, tortas doces, muffins, bolos, frios, embutidos, queijos, iogurte, leite, café, chocolate quente, ovos mexidos, tostadas francesas, mini panquecas. Alguns estrangeiros eram avessos à fila no buffet e, sem cerimônia, enfiavam o prato ou a mão na frente de onde estávamos para pegar alguma coisa. Pareciam mortos de fome. O café da manhã ficava disponível por uma hora. Depois disto (e mesmo antes das 8 horas), um pequeno serviço, também self service, ficava à disposição dos passageiros de 6 horas às 18 horas no Salão Sky. Conforme orientação amplamente divulgada, às 09:15 horas estávamos vestidos com roupas para enfrentar o frio de 8º C, piso com lama e umidade, além de ostentar o colete salva vidas no corpo, devidamente ajustado. O ponto de encontro para nossa turma era o Salão Sky, onde recebemos instruções de como entrar no bote Zodiac que faria o nosso transporte do Stella Australis para terra firme, em frente ao Glaciar Marinelli, integrante da Cordilheira Darwin. Cada bote comportava até 12 passageiros, além do condutor. Antes de embarcar, cada um teve que retirar uma plaqueta que ficava presa ao colete salva-vidas com o número da cabine que ocupava. Era para o controle dos tripulantes para saber quem saiu e quem voltou ao barco. O local de embarque era atrás do navio, no nível da primeira coberta. Para entrar no Zodiac, apoia-se o pé na borda de borracha para ficar em pé rapidamente dentro do bote, sentando-se imediatamente na borda e deslizando, assentado, até perto do condutor, onde ficava o motor. Entra-se um de cada vez, indo, alternadamente, para os lados, até ficar completo. O trajeto é bem rápido. Em terra, desliza-se sentado até a borda contrária ao motor e, sentado, gira-se para o lado, colocando os dois pés em terra firme. Retirei o colete, deixando-o no chão, com uma pedra em cima para identificar que era o por mim usado (já que estava ajustado para meu corpo). O grupo de brasileiros, 26 no total, seria acompanhado por toda a expedição pelo guia Cristóbal, um chileno que adora o Brasil (tem uma namorada brasileira em Valinhos, São Paulo) e domina o português. Neste primeiro passeio, conhecemos um pouco da fauna, quando vi um pé de calafate, frutinha parecida com o mirtilo e onipresente nas refeições no navio, pés carregados de chaura (amarga), uma fruta local que, segundo dizem, quem dela come retorna à Patagônia, pés de frutilla del diablo, uma pequena fruta parecida com o morango mas que, se ingerida, provoca uma intensa diarreia. Tanto no navio, quanto no passeio, sempre fomos alertados para não comer nada que encontrássemos sem perguntar ao guia, pois podíamos nos dar mal. Além deste morango do diabo, há muitos mariscos nas pedras, mas o local tem a chamada maré vermelha, o que deixa tais mariscos tóxicos. Vimos, de longe, a geleira Glaciar Marinelli. Mesmo à distância, é impressionante. Entramos no pequeno bosque perto da praia, conhecendo as únicas três espécies de árvores da Patagônia e uma castoreira, mas não vimos nenhum castor. Este animal foi introduzido na década de quarenta (25 casais) na região por ter clima semelhante ao seu habitat natural, o Canadá, com o objetivo de vender a pele no mercado internacional. Mas logo descobriram que a pele era ruim, motivo pelo qual não mais foram abatidos/caçados. Hoje viraram uma praga por toda a região, estimando-se que existam mais de 150 mil castores. Segundo o guia disse, há pesquisas que dizem que a pele do castor para ficar macia e com alto valor de mercado, é necessária adrenalina e como não há predadores naturais deste animal na Patagônia, os ursos, por exemplo, eles não soltam adrenalina pois nunca se veem em perigo. O passeio termina às margens de um pequeno riacho que desemboca na mesma praia onde desembarcamos. Um dos brasileiros, um senhor já com mais de 60 anos, resolveu tirar toda a roupa, ficando apenas de cueca, para entrar na gelada água. Entrou, nadou, saiu, se secou, vestiu a pesada roupa de inverno e voltou para o navio. Corajoso. Na volta, novamente vestidos com nossos coletes, o bote foi em direção a uma ilhota de pedra onde um casal de elefantes marinhos com dois filhotes tomavam um pouco de sol. Pausa para fotos e retorno ao navio, onde tivemos tempo livre até ser servido o almoço, a partir de 13 horas. Assim que cheguei de volta, peguei a plaqueta de meu colete, retornei à cabine, tomei um ótimo banho e fui até à loja comprar uma calça impermeável, pois a calça que levei, própria para andar na neve, era muito grande e fiquei parecendo uma pata choca, sem bunda. Por U$ 47 comprei uma calça à prova de água e corta-vento, que vem embalada em seu próprio bolso traseiro. Muito prática e leve, ocupando pouco espaço em uma mala. Veste-se por cima de uma calça jeans, por exemplo. Quando anunciaram que o almoço estava servido, tratamos de ir logo para evitar as filas no buffet. Intitulado "Buffet Italiano", tinha as seguintes opções: berinjela, salada italiana, tomates, queijo de cabra, azeitonas, presunto cru, ovos de codorna, anchovas, pimentão vermelho, mussarela, ratatouille (quem disse que este prato é italiano?), anéis de lulas fritos, peru cozido, ravióli de espinafre, talharim, nhoque, lasanha à bolonhesa. Uma variedade grande de doces fazia a alegria de quem gosta de sobremesa. Entre as opções, sorvete de calafate, que experimentei e gostei. Após o almoço, um longo período de descanso, que aproveitei para dormir, enquanto o navio navegava em direção às Ilhotas Tucker, local escolhido por uma colônia de 2 mil pinguins para sua reprodução. Os passageiros foram divididos por grupos, pois não havia a possibilidade de todos desembarcarem juntos, já que o passeio dura uma hora sem que ninguém saia dos botes Zodiac. Minha turma só desembarcou às 17:50 horas. Como não haveria desembarque em terra, não foi necessário tirar a plaqueta do colete, mas seu uso é obrigatório em toda saída do navio durante o cruzeiro. Fiquei com o guia Cristóbal. Ele foi falando sobre as aves que também escolheram as ilhas para se reproduzirem, como os cormorões e os chimangos. A primeira parte visitada da ilha são as pedras onde ficam as aves, depois chegamos à praia onde estavam os pinguins. São 17 espécies de pinguins existentes no mundo, todas somente no Hemisfério Sul. Os que estávamos vendo são os pinguins de magalhães. São pequenos, com o corpo em preto e branco e muito barulhentos. Foi uma ótima experiência. Voltamos ao barco vendo um belo revoar de pássaros. O tempo ajudava, pois o céu estava azul e o sol brilhava. No Stella Australis, era hora de se preparar para o jantar.
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